Olá leitores, como estão? Bom, hoje eu
gostaria de apresentar a vocês um pequeno projeto aqui no blog que vai
funcionar, mais ou menos, como uma leitura
conjunta. O livro escolhido para essa empreitada foi O Conde de Monte Cristo do escritor francês Alexandre Dumas. O romance é
dividido em seis partes (seguindo a edição de bolso de luxo da Zahar), então a cada parte terminada eu, Vinícius, venho aqui e digo o que achei. Além de tentar ajudá-los com alguns elementos históricos
do livro. Não se trata de uma análise profunda, mas apenas um apanhado geral do
que se passa. Para evitar possíveis revelações do enredo,
e acabar por estragar a leitura de vocês, darei apenas algumas
"pinceladas" sobre os fatos narrados nesta primeira parte.
Tudo começa em Fevereiro de 1815, um dos
anos mais conturbados da história da França. É interessante salientar que a
escolha desse ano para situar os fatos é fundamental para o desenvolvimento do
livro. Assim como em Os
Miseráveis (Victor Hugo), o plano de fundo histórico
se mistura com o enredo tornando a obra um importante relato da sociedade da
época.
Antes de 1815 a França ainda era um Império governado por Napoleão Bonaparte. Porém,
diante do expansionismo napoleônico, os países europeus se reuniram
com o objetivo de pará-lo (Coligações),
derrubando seu governo em 1813 com a assinatura de sua rendição; seguido do
isolamento na Ilha de Elba (Mediterrâneo).
Após a queda de Napoleão, ocorre o Congresso de Viena (1814-1815), uma tentativa de
reordenar a Europa tendo como base a organização existente antes da Revolução Francesa. Existem
diversos princípios que foram apresentados durante o Congresso, mas o que
realmente interessa para o entendimento da história é o Princípio da Legitimidade,
no livro chamado de Restauração.
Como o objetivo era a organização existente antes da Revolução Francesa,
na França foi dado o direito da dinastia
Bourboun de exercer o trono
francês. A monarquia, portanto, foi restaurada com Luís XVIII, herdeiro do trono,
coroado rei.
É aqui que a nossa história começa. O
navio Pharaon está chegando no porto de Marselha
carregado de mantimentos e com uma notícia terrível. O capitão morreu durante a
viagem, cabendo ao jovem Edmond
Dantès assumir o comando da
embarcação. Porém, antes de sua morte, Leclère delega a Dantès uma última
missão que o conduzirá até Ilha
de Elba, onde reside em exílio Napoleão Bonaparte. Quando Dantès conta
ao Sr. Morrel (dono de uma espécie de
companhia de embarcações que comanda esse tráfego de encomendas, a Casa
Morrel & Filho) que esteve diante do imperador, ele
o puxa para perto dele, olhando em volta, a fim de perguntar como o antigo
monarca está. Morrel trata Napoleão como se ele ainda fosse um imperador, mostrando certo apresso que alguns
personagens ainda possuem por Napoleão, além do medo existente de que isso seja
descoberto — uma vez que, ser acusado de bonapartista durante o período
em que a monarquia reinava, era um crime gravíssimo. Essa primeira cena mostrada no
início da história introduz ao leitor, de certa forma, o que está por
vir.
A missão de Dantès na Ilha era entregar
uma encomenda ao Grão-Marechal
Bertrand; uma vez cumprida, no entanto, ainda não estava finalizada.
Faltava a Dantès, quando chegasse a Marselha, partir para Paris e entregar uma carta, que assim como a
encomenda também havia sido deixada por Leclère, a outro homem, o qual ele
não conhecia. E é essa bendita carta que vai conduzir toda a problemática da
trama durante essa primeira parte. Achei extremamente interessante o papel
dela na história. É como se ela fosse uma cola que une todas as tramas, todos os personagens.
Depois de se explicar a Morrel, Dantès
recebe uma incrível proposta: tornar-se, efetivamente, o capitão do Pharaon, oferta imperdível
que só aumenta as esperanças dele de mudar sua vida e, quem sabe, alcançar a
plena felicidade. Com esse "emprego" ele poderia muito bem ajudar o
pai enfermo e se casar o mais rápido possível com Mercedes, uma catalã por quem
ele é perdidamente apaixonado. No entanto, nem tudo é perfeito. Existe um
complô baseado na inveja e na ganância contra Dantès que começa a nascer já
durante a viagem do Pharaon.
Danglars faz parte da tripulação do navio e, como é
deixado implícito logo no primeiro capítulo, andava espionando as
conversas entre Dantes e Leclère. Existe nitidamente uma áurea de inveja em
cima de Danglars, ele almeja o cargo de capitão do navio e, quando descobre que
Dantès pode colocar tudo isso a perder, logo se vê envolvido pela vontade de
destruí-lo.
Ele, no entanto, não é o único invejando a
vida de Dantes. Fernand mora na mesma vila de catalães que Mercedes, é
perdidamente apaixonado pela moça e não entende a insistência dela de esperar
por Dantes. Motivado a separar a moça do nosso herói, Fernand se torna uma peça
fundamental na vingança que será arquitetada por Danglars.
É durante uma pequena comemoração do
noivado entre Dantès e Mercedes que ocorre a prisão. Sem saber ao certo pelo o
que está sendo condenado, ele é levado pela polícia para ser interrogado pelo
substituto do procurador do rei, o sr.
de Villeford. Villeford recebe uma denúncia
anônima, acusando Dantès de
simpatizar com o comitê bonapartista de Paris e com as ideias revolucionárias,
também durante a sua festa de noivado. A denúncia diz claramente que existe uma carta sob o domínio de Dantès que confirma sua suposta identidade de revolucionário.
O pai de Villeford, no entanto, tem um
papel bem mais importante nessa parte da história. Noirtier, durante a época da
Revolução Francesa, fazia parte do grupo dos girondinos e, quando Napoleão deu o golpe do 18 do Brumário, tão
logo tratou-se de se aliar ao novo governo. Há fortes indícios de que Noirtier
é bonapartista (simpatizante de Napoleão Bonaparte).
Para proteger o pai, uma vez que ele é o destinatário da carta que Leclère deixou, Villeford decide prender Dantès levando em consideração, no entanto, motivos muito mais pessoais do que a verdade em si. É bem claro na história que Dantès não sabia do conteúdo da carta, conhecendo apenas o seu destinatário. Uma lastimável coincidência.
Um raio que se abatesse sobre Villefort não o teria atingido com golpe mais fulminante e imprevisto. Desmoronando novamente em sua poltrona, da qual se soerguera para alcançar o maço de papéis confiscados de Dantès, e folheando-o precipitadamente, dele retirou a carta fatal, sobre a qual lançou um olhar marcado por indescritível terror.
— Sr. Noirtier, rua Coq-Héron no13 — murmurou, empalidecendo cada vez mais.
— Sim, senhor — respondeu Dantès, perplexo —, conhece-o?
— Não — respondeu Villefort afobadamente —, um fiel do servidor do rei não conhece conspiradores.
— Trata-se então de uma conspiração? — perguntou Dantès, que, após julgar-se livre, voltava a ser invadido por um terror mais intenso que o primeiro. — Em todo caso, senhor, como já lhe disse, eu ignorava completamente o teor da correspondência de que era o portador. (pg. 100)
Enquanto Dantès é enviado para o Castelo de If, uma fortaleza para criminosos no meio do mar, a França vive outro momento conturbado. Um novo plano de fundo histórico surge aqui; o Governo dos Cem Dias (Março-Julho de 1815) de Napoleão. Esse é um período da história da França em que Napoleão foge do exílio na Ilha de Elba e toma o trono das mãos de Luís XVIII que, por sua vez, foge. No entanto, os países que formavam a Coligação se reúnem novamente e derrubam o imperador, derrotando-o durante a Batalha de Waterloo. É engraçado acompanhar isso porque essa Batalha também é abordada em Os Miseráveis, fica então estabelecido meio que um elo entre as obras o que eu, particularmente, acho fantástico. Existe um capítulo dentro do livro que fala bem rapidamente sobre os Cem Dias.
O sr. Noirtier era um
exímio profeta, e as coisas caminharam aceleradamente, como ele dissera. Todos
conhecem o retorno da ilha de Elba, retorno estranho, milagroso, que, sem
exemplo no passado, provavelmente permanecerá sem imitação no futuro.
Luís XVIII não tentou
senão debilmente aparar tão rude estocada. Sua falta de confiança nos homens
minava sua confiança nos fatos. A realeza, ou melhor, a monarquia
recém-reconstituída por ele, tremeu em suas bases ainda instáveis, bastando um
único gesto do imperador para fazer ruir todo aquele edifício, mistura informe
de velhos preconceitos e ideias novas.(pg. 158)
Assim que Napoleão retoma seu trono, toda a estrutura política existente durante a monarquia se desestrutura, ou seja, aqueles que apoiavam a monarquia são meio que colocados na "clandestinidade" enquanto que aqueles que apoiavam Bonaparte, e eram considerados criminosos, se tornam os principais a frente do governo.
Mas, e Dantès? O que acontece com ele? Isso é assunto para o próximo post. Calma, a primeira parte ainda não acabou. Até mais!